Todo profissional brasileiro da área de ciências biológicas (e muitos de outras áreas), salvo que tenha passado o último meio século viajando por galáxias distantes, sabe quem é Paulo Emílio Vanzolini. Herpetologista (especialista em anfíbios e répteis), Paulo Vanzolini foi diretor do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo de 1963 a 1993, tendo descrito várias espécies de lagartos e serpentes, e cujo acervo aumentou de pouco mais de mil para cerca de 230 mil espécimes. Também é o principal idealizador da ainda controversa Teoria dos Refúgios, que procura explicar a grande diversidade faunística das florestas tropicais. Também é conhecido pelas suas composições, especialmente sambas, dentre elas as célebres “Ronda” e “Volta Por Cima”. Além de um dos mais conhecidos e respeitados cientistas brasileiros, também é considerado um ícone da boemia paulistana.
Em 2003, às vésperas de Paulo Vanzolini completar 80 anos, foi publicada a antologia “Acerto de Contas”, compilação da essência da sua obra musical. Em 2009, é lançado o documentário biográfico “Um Homem de Moral”, do diretor Ricardo Dias. Mas este também apresenta ênfase no seu lado compositor, acima até mesmo da sua personalidade.
Faltava mesmo uma obra que abordasse exclusivamente o Vanzolini cientista. E esta acaba de chegar. Já aviso o leitor, contudo, que a notícia não é de todo boa. Lançado na última sexta feira, dia 15, o enorme volume “Evolução ao Nível de Espécie – Répteis da América do Sul” reúne, na íntegra, todos (isso mesmo, todos) os artigos científicos de Paulo Vanzolini, em 704 páginas, perfazendo um período que vai de 1947 a 2004. A obra traz ainda um CD com a centena de artigos que completam a sua produção científica. Sem dúvida essencial para qualquer pesquisador, estudante ou apreciador do gênero.
Mas nem tudo são flores. A qualidade indiscutível da obra, bem como a sua importância para quem quiser pesquisar tanto a carreira de Vanzolini quanto a sua contribuição para a ciência brasileira vem acompanhada de duas características nada amistosas. A primeira é o preço salgado (R$ 120,00). A segunda é que a sua distribuição ficou bastante restrita, sendo praticamente impossível encontrá-la fora dos canais Fapesp.
Infelizmente, não é de hoje que isso acontece. A produção especializada de determinadas áreas científicas dificilmente chega às grandes livrarias no Brasil. Também sabemos que, em se tratando de bibliotecas, jamais chega às unidades públicas comuns, permanecendo naquelas dos seus cursos correspondentes das grandes universidades. Isso é um resquício do pensamento colonial de que conhecimento científico deva ficar guardado com os cientistas, pois a população leiga não saberia tirar proveito do mesmo. Ledo engano. Isso é subestimar a inteligência do indivíduo. Desta maneira, fica muito difícil para um professor de educação fundamental (que em geral recebe um salário vergonhoso e trabalha em condições precárias) ter acesso aos trabalhos que julga importante. E é mais difícil ainda para uma nação habituada a várias gerações de governo de pão e circo gostar de ciência, se ela não consegue ter acesso à produção científica do seu próprio país. A ciência brasileira é de fato um conhecimento livre, mas está longe de chegar igualmente a todos. Coloque nas mãos de um aluno um trabalho especializado sobre aquilo que ele gosta (não importa a profundidade com o qual o mesmo é tratado) e se surpreenderá. Sei disso não apenas por ter observado este fato em alguns dos meus alunos, mas também por eu mesmo ter sido esse tipo de aluno. Quem pensa que o “beabá” da ciência dos primeiros anos de escola é mais que suficiente para quem ainda não chegou às cadeiras da universidade, não faz jus ao diploma que possui; ainda mais se ostenta o título de professor. Depois reclamam do ensino de ciência básica no nosso país.
Organizador: Editora Beca
Autor: Paulo Emílio Vanzolini (textos)
Editora: Beca/Fapesp
Edição: 1
Páginas: 704
Idioma: português
Preço: R$ 120,00 em média
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