domingo, novembro 20, 2011

COMO COMPREENDER UM BIÓLOGO



É raro, mas vez por outra encontramos textos anônimos interessantíssimos na internet. Hoje decidi compartilhar uma dessas jóias com os meus visitantes. Tudo indica que a mesma só pode te sido redigida por um(a) biólogo(a) apaixonado(a) pelo seu trabalho. Ele não é novo e já rodou praticamente toda a rede, mas fica aqui para os que ainda não o conhecem.
Sendo apenas realista e sem querer puxar a brasa para a nossa sardinha, afirmo sem medo de errar que ser biólogo é muito mais do que uma simples profissão ou fonte de renda – mesmo porque em se tratando de renda na área das ciências biológicas e mesmo da ciência de um modo geral no Brasil a coisa é decepcionante, pra não dizer desesperadora. É um estilo de vida. Um biólogo (ou ao menos um biólogo de verdade) não apenas trabalha com biologia, ele simplesmente vive biologia. Ninguém estuda biologia atrás de dinheiro ou status social (felizmente ou infelizmente, não tem nem como), à semelhança do que ocorre com outras áreas. Quem resolve estudar seriamente biologia tem que, antes de tudo, gostar de biologia. E tem que ter uma coragem que só mesmo o gosto e a afinidade com a coisa são capazes de produzir. Quem não tem afinidade com a área acaba desistindo logo no início. Como me disse um colega certa vez: “Sem desmerecer os outros profissionais, mas certos cursos qualquer mané é capaz de fazer. Agora, para fazer ciência, para fazer biologia, o cara tem que ter culhão.”
Eu, por exemplo, fui um caso raro entre os adolescentes da minha época. Sempre soube a área que queria seguir, o que eu gostaria de estudar. Nunca tive nenhuma dúvida vocacional, ao contrário da imensa maioria dos meus amigos e colegas. Desde criança procurando bichinhos nos matagais e tentando descobrir como eles eram e viviam – sem contar as incontáveis picadas. E sem nenhum medo de brincar com um escorpião ou aranha, coisa que deixava a minha mãe apavorada. Pedindo livros e revistas sobre animais de presente e comprando-as nas livrarias e bancas de jornal sempre que surgia a oportunidade. Vendo beleza em cada detalhe da anatomia e do comportamento de cada espécie, muitas das quais rejeitadas pela maioria das pessoas. Depois vieram as criações de minhoca, os tenébrios, os aquários, terrários mais elaborados, a taxidermia e coisas do gênero. Tudo bem que houve um momento em que minha paixão pelos animais me fez pensar em seguir medicina veterinária. Mas depois que eu descobri que nesta área não estudaria vida pré-histórica e que as espécies silvestres ficariam em segundo plano, tive a certeza definitiva que meu o caminho estava diretamente ligado à biologia.
Li certa vez que o dia do biólogo (3 de setembro) pode ser considerado o dia de todas as espécies. Concordo plenamente. Temos o dia da árvore, da água, da Terra. Faltava um dia dedicado aos seres vivos e não apenas a um único tipo. Além de ser extremamente justo com o profissional que estuda os seres vivos.
De fato, estudar a vida é descobrir algo novo a cada trabalho, a cada dia. E o biólogo que realmente ama o seu trabalho sente nele o mesmo arrebatamento da descoberta que sentíamos quando criança ao observar insetos num jardim. Como escreveu o brilhante Richard Durrell no seu apaixonante livro “O Naturalista Amador”, os apaixonados pela natureza jamais padecerão de um mal que acomete a maior parte da humanidade moderna: o tédio.

Como Compreender um Biólogo
Tenha paciência ao caminhar com ele na rua. É provável que ele faça paradas freqüentes... Sempre há uma formiga carregando uma folha gigantesca nas costas ou uma samambaia disposta de uma forma estranha num buraco do muro.
Ele acha isso incrível!!!
Toda vez que vocês entrarem em qualquer assunto que envolva a área dele, ele se empolgará. Finja que presta atenção no que ele diz. Finja que está entendendo também. Entenda que o conceito de beleza de seu amigo biólogo é um tantinho diferente do seu. Sapos verdes, gosmentos e verruguentos são lindos. Escorpiões, aranhas, opiliões (hein?), aye-ayes (heeeiiinnn???!!!)... são todos lindos.Tente não vomitar quando ele te mostrar as fotos da última necropsia feita num golfinho.
Simplesmente ignore quando o encontrar agachado sobre o musgo... e faça o possível para que ele não te veja, pois uma vez que isso acontecer ele começará o discurso em biologuês: “são briófitas! São as plantas mais simples! Você acredita que elas não têm nem vasos condutores? E elas ainda dependem da água para a fecundação e...”
É provável que ele prefira ir para o congresso de Mastozoologia ao invés daquela viagem romântica. Você quer ajudá-lo? Mostre que há outras coisas no mundo, por exemplo... convide-o para ir a um museu de arte. Ou a um grupo de discussão sobre literatura.
Ele terá tendência a chamar pinheiros de gimnospermas. E a pinha (de onde
vem o pinhão) de estróbilo.
Não, ele não é um maníaco suicida se decidir entrar numa jaula para mergulhar com tubarões-brancos. Mas também não deve estar em seu juízo perfeito.
Ah, e é melhor você assistir filmes como Dinossauros, A Era do Gelo e Procurando Nemo com amigos que não sejam biólogos. Caso contrário você ouvirá, durante o filme: “ah, mas baleias não têm essa conexão entre a boca e o nariz, o Marlin e a Dori nunca poderiam ter saído pelas narinas dela!” E quem se importa? Bem, ELE se importa, e muito.



segunda-feira, outubro 24, 2011

III ENCONTRO DE COSMOS NO YOUTUBE

O amigo Renato A. Azevedo adicionou no seu perfil do Youtube videos com trechos de todas as palestras ministradas no III Encontro de Cosmos, ocorrido no dia 08 de outubro de 2011. Estão incluidos dois videos da minha palestra "Evolução e Extinção".
Segue o endereço:
http://www.youtube.com/watch?v=YkV-bn-q0Mo&feature=bf_prev&list=ULqrnMsCAaxvU&lf=mfu_in_order

Só agora notei que cometi um erro grosseiro na minha apresentação. O mesmo pode ser conferido no primeiro video video, onde menciono "efeitos especiais que existiam hoje". Se existiam, então não existem mais hoje, ora bolas. Minhas sinceras desculpas, amigos leitores.
Agradeço mais uma vez aos amigos do site Aumanack pela oportunidade, ao amigo Renato pela filmagem, aos presentes pelo prestigio e a todos aqueles que quiseram mas não puderam estar fisicamente presentes pelo apoio.

terça-feira, setembro 27, 2011

III ENCONTRO COSMOS: TERRA E ESPAÇO

Nascia há 31 anos uma das séries televisivas de maior sucesso mundial: Cosmos.

Criada por Carl Sagan e sua esposa Ann Druyan, ela foi veiculada pela primeira vez em 1980 nos EUA, chegando dois anos depois ao Brasil.
O grande sucesso da série não era a ficção cientifica com suas naves espaciais ou seres alienígenas. Era o contrário. Carl Sagan conseguiu manter pessoas no mundo inteiro assistindo aos episódios de uma série que falava sobre Ciências.
Em seus episódios, pudemos conhecer um pouco mais sobre outros planetas e as estrelas, mas também sobre a vida na Terra e problemas ecológicos, em uma época que poucas pessoas falavam sobre isso.
Cosmos antecipou problemas como o efeito estufa, aquecimento global, falta de água e tantos outros que vivemos atualmente.
Carl Sagan foi um homem sempre a frente de seu tempo, uma ser humano sem medo de errar e que ensinou a gerações a ter amor pela Ciência e acima de tudo, pela própria raça humana.


Serviço:

Data: 08 de outubro de 2011
Horário: 9h00 as 18h00
Local: Auditório da Estação Ciência
Endereço: Rua Guaicurus, 1394 - Lapa - São Paulo  (Ao lado da Estação Lapa da CPTM e do Terminal de ônibus, em frente ao Shopping Center Lapa)
Entrada: O evento Cosmos é gratuito. Será cobrado o valor da própria Estação Ciência, R$ 4,00 (veja valor atualizado no site da Estação). Estudantes e portadores de necessidades especiais - meia entrada. Isentos: Professores (com comprovação); monitor, agente ou guia de turismo (com registro Embratur); comunidade USP (com carteirinha válida na catraca); menores de 6 anos e maiores de 60 anos.
Evento sem fins lucrativos. Pedimos aos visitantes que levem 1 kg de alimento não perecível.


Programação*

- 9h00 – Abertura do evento
- 9h05 – Episódio 10: “O Limiar da Eternidade” série Cosmos - legendado
- 10h00 – Palestra: “Extraterrestres: Ficção, Ciência e Polêmica”. Palestrante: Renato Azevedo – site Aumanack
- 11h00 – Palestra “Presente de um mundo distante”. Palestrante: Douglas Camillo-Reis  Grupo de Ficção Científica Alpha
- 12h00 – Episódio 9:  “A Vida das Estrelas” série Cosmos - legendado
 - 13h00 – Palestra "Evolução e Extinção" Palestrante: Átila Oliveira
- 14h10 – Palestra “Buracos negros – vilões do universo?” Palestrante Sílvia Reis – Grupo de Ficção Científica Alpha
 -15h20 – Palestra “Os ônibus espaciais e a conquista do espaço - O Fim de uma Era” Palestrante Denis Zoqbi – Clube de Astronomia de São Paulo
- 16h30 – Palestra  “A verdade sobre um ponto de vista: As mudanças e os modos como às pessoas interpretam a ciência".  Palestrante Alan Uemura - site Aumanack
- 17h45 – Sorteio
- 18h00 – Encerramento

*programação sujeita a alterações


Sinopses:

O Limiar da Eternidade: Neste episódio Carl Sagan apresenta diferentes teorias acerca da origem e destino do Universo, desde lendas e crenças à astrofísica. Para tanto, Sagan apresenta noções básicas de físicas, explicando a questão das 3 dimensões e a possível quarta dimensão (tentando exibir o que seria um Tesseract), bem como o efeito Doppler e sua repercussão para o teoria do universo em expansão, descoberto através das observações esmeradas de Milton L. Humason e Edwin Hubble.  Ao tratar do big bang, faz uma regressão às explicações cosmológicas do hinduísmo, especialmente a "dança cósmica" do deus Shiva, numa escultura do Império Chola.

Extraterrestres: Ficção, Ciência, e Polêmica: Ao longo de mais de um século, os extraterrestres têm capturado a imaginação  da humanidade. Desde a publicação de A Guerra dos Mundos, de H.G. Wells, as pessoas fazem à pergunta: eles existem?  Na ficção, produções literárias, televisivas e cinematográficas têm explorado a exaustão as mais variadas facetas da vida extraterrestre.  As descobertas científicas parecem indicar que é questão de tempo a comprovação da existência de vida fora da Terra. Mesmo assim, as polêmicas ainda existem, a exemplo das recentes declarações do astrofísico Stephen Hawking, alertando que a chegada de alienígenas à Terra podem ameaçar nossa espécie. Nesta palestra, será traçado um panorama a respeito das múltiplas formas com que enxergamos aqueles que Carl Sagan descreveu como "nossos irmãos e irmãs no Cosmos". 
Renato Azevedo é engenheiro eletrônico e escritor. Autor de "De Roswell a Varginha" (2008). Consultor da revista UFO e colaborador da revista Sci-Fi News, coluna Quem conta um conto..., publicando a série de  contos A Lista. Co-editor do site Aumanack. Autor convidado nas antologias  Ufo: Contos Não Identificados (2010), e Medieval Scifi (2010). Participante das antologias Histórias Fantásticas Volume 1 (2010), Imaginários 4 (2011), e A Fantástica Literatura Queer (2011). Escreve o blog Escritor com R (http://escritorcomr.blog.uol.com.br).

Presente de Um Mundo Distante: "Como a Humanidade se apresentará perante a Galáxia. Em havendo alguém mais na vastidão do oceano cósmico para compararmos notas, descobertas, alegrias e arrependimentos, de que modo os seres que surgiram e cresceram no pálido ponto azul que chamamos de Terra se expressarão sobre sua existência e suas intenções futuras? Os cientistas da NASA, entre eles o renomado Carl Sagan, buscaram responder a esta indagação, e produziram um dos mais belos trabalhos unindo arte e ciência.", como o Disco de Ouro da Nave Voyager e a Placa da nave Pioneer desenhada pelo próprio Carl Sagan.
Douglas Camillo-Reis é escritor de ficção científica e roteirista do Grupo de Teatro Zona Neutra, a divisão de teatro do Grupo de Ficção Científica Alpha.

A Vida das Estrelas:  Neste episódio, Carl Sagan parte do simples ato de fazer uma torta de maçã para falar de átomos e partículas subatômicas.  Muitos dos ingredientes necessários são compostos de elementos químicos, formados durante a vida e morte das estrelas, resultando em gigantes vermelhas e supernovas, que colapsam em anãs brancas, estrelas de nêutrons, pulsares e buracos negros, e produzem vários tipos de fenômenos.

Evolução e Extinção: O universo é extremamente dinâmico e nada nele é eterno. Mesmo as estrelas nascem e morrem. O próprio cosmo teve um início. Não poderia ser diferente com a vida no planeta Terra. Os seres vivos que o habitam nem sempre foram iguais ao que são hoje. Isso se deve em parte ao fato da história da Terra apresentar cinco episódios de extinção em massa, onde a vida literalmente quase acabou. E ela encontrou maneiras de repovoar-se após todos os cinco, por meio da evolução e diversificação dos tipos sobreviventes. Portanto, não seria errado afirmar que as extinções ajudaram (e ajudam) a moldar a evolução da vida em nosso planeta. Contudo, muitos especialistas hoje reconhecem que estamos passando por um sexto episódio de extinção em massa, que não deixa nada a dever a nenhum dos anteriores, e com um grande diferencial: dessa vez a mão humana parece ter sido um agente fundamental.
Átila Oliveira é biólogo e educador. Autor do blog Pegadas de Um Dinossauro do Século XXI (atilassauro.blogspot.com) sobre zoologia, paleontologia e evolução biológica, combatendo o  criacionismo e outras formas de pseudociência. Colaborador do site Aumanack e Biomania.

Buracos Negros – Vilões do Universo?  Buracos negros são um dos objetos mais misteriosos do universo, exercendo fascínio e por vezes temor. Hoje a ciência estima que toda galáxia tenha um em seu centro. Mas como surgem e qual seu papel na evolução do Universo? Qual seu raio de ação?  Seria possível viajar no tempo através deles, ou criar um microburaco negro em laboratório? Serão abordadas essas e outras questões como a diferença entre buracos negros, buracos brancos e buracos de minhoca, bem como a confiabilidade das informações científicas a que temos acesso.
Sílvia Reis é astrônoma amadora, pedagoga, psicopedagoga e autora de 10 livros na área da educação. Fez a assessoria pedagógica e a co-roteirização da sessão “Uma aventura pelo Sistema Solar” do Planetário Municipal de São Paulo.  É integrante do Grupo de Observações Avançadas do Clube de Astronomia de São Paulo, onde é coordenadora.  Presidente do Grupo de Ficção Científica Alpha e Grupo de Teatro Zona Neutra: http://alphafiction.wordpress.com/   e  www.grupozonaneutra.com

Os ônibus espaciais e a conquista do espaço - O Fim de uma Era: Graças ao domínio das tecnologias dos vôos tripulados, a conquista do espaço deu um enorme salto em busca de requinte e sofisticação. Novas plataformas de trabalho como a Estação Espacial Internacional, novos equipamentos e até telescópios espaciais só puderam ser colocados em órbita graças aos vôos dos ônibus espaciais. Veículos que trouxeram luz à ciência,  e tragédias que ensinaram o homem a repensar sua história.
Denis Zoqbi é radioastrônomo amador e instrutor de Astronomia junto ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia - INCT e atualmente coordena os cursos de Iniciação em Astronomia do CASP - Clube de Astronomia de São Paulo.

A Verdade Sobre um Ponto de Vista: As mudanças e o modo como as pessoas interpretam a ciência: Durante os séculos a ciência evoluiu. De um mundo cheio de monstros aos monstros tecnológicos. O que ontem era visto como "verdade", hoje foi derrubado e damos risada de nossa ingenuidade. A ciência e o mundo são desta forma, um "ponto de vista" do nosso conhecimento e cultura em que vivemos. Nesta palestra, queremos mostrar como algumas descobertas cientificas muitas vezes dependem apenas de um ponto de vista.
Alan Uemura é jornalista, editor dos sites Aumanack (www.aumanack.com) e Nippak Online (www.nippak.com.br)

Organização: Site Aumanack e Grupo de Ficção Científica Alpha
Apoio: Estação Ciência

Mais informações: http://www.eciencia.usp.br/



ANIVERSÁRIO DO BLOG

Há pouco mais de uma semana (dia 18 de setembro) este blog completou um ano no seu novo endereço. Ainda que a correria dos últimos meses (provocada, felizmente, por motivos muito bons) tenha me impedido de postar com a freqüência que gostaria (e que havia prometido), fico feliz em notar que o meu principal objetivo fora alcançado: um blog focado, regular, esclarecedor dentro das limitações do seu autor e, especialmente, muito bem frequentado, com comentários pertinentes de gente realmente interessada no assunto.
Fazendo uso de um típico clichê dessas situações, aproveito para mostrar os 10 posts mais visitados do blog nesses 365 dias (clique na imagem para ampliá-la e visualizá-la melhor):



Como os leitores podem notar, os dinossauros encabeçam a lista, sendo assunto dos três posts mais lidos – com o célebre T. rex protagonizando o primeiríssimo lugar (PREDADOR OU CARNICEIRO?), com 1.270 visitas até o momento. Nada mais gratificante para um espaço voltado principalmente para a paleontologia e evolução biológica. Contudo, o quarto (BELAS, SIM... MAS ANTES DISSO, CRAQUES) e sétimo (PARA QUEM GOSTA DE MULHER) lugares comprovam que mulher bonita é sempre assunto com visita garantida. E falando em mulher, minhas considerações sobre a proposta da Slut Walk SP (NÃO, MULHER NÃO É TUDO VACA), além de ocupar o sexto lugar, teve ótima repercussão (14 comentários) só perdendo neste quesito para 10 INDICIOS DE QUE VOCÊ É UM PSEUDONERD (com 16 comentários e muita gente irritada por vestir a carapuça). Grande repercussão também teve HOMOSSEXUALIDADE ANIMAL (oitavo mais visitado), com 13comentários e muitos homofóbicos tendo que encarar a fragilidade do seu principal argumento: o de que homossexualidade seria algo contra a natureza e portanto uma aberração.
Agradeço a todos os visitantes e divulgadores do blog (grandes amigos, amigos virtuais e ilustres desconhecidos) pelo alcance que alguns dos meus textos tiveram, graças as suas indicações e repassadas. Sem vocês esse espaço seria apenas algo pessoal e restrito. Nada contra quem prefere fazer um blog nesse estilo, mas a minha proposta é outra. Esclarecendo, informando e, principalmente, fazendo pensar, sinto que estou no caminho certo. E, lembrando, sempre aberto a críticas e sugestões.
Para os próximos dias, aguardem posts instigantes. Abraço pra quem for de abraço, beijo pra quem for de beijo.

segunda-feira, julho 18, 2011

10 BOAS NOTÍCIAS DOS ÚLTIMOS 45 DIAS

  • Norte americano compõe rap em homenagem a Charles Darwin. A cultura geral ajudando a popularizar a ciência.
  • Neurocientistas da Universidade de Michigan confirmam o que todos os amantes da natureza já sabiam há tempos: o contato com elementos naturais, mesmo uma pequena área arborizada de uma grande metrópole ou um animal de estimação, reduz o estresse, a ansiedade, a tristeza, o cansaço e a possibilidade de depressão, além de aumentar a capacidade do indivíduo para solucionar problemas.
  • Grupo de pesquisadores da Universidade Rockefeller, liderado pelo brasileiro Michel Nussenzweig, descobre uma origem comum para mais de 570 tipos de anticorpos que atacam o HIV, o que aumenta as chances de uma possível terapia gênica para a AIDS. A pesquisa está na revista Science.
  • A coluna “Escuta Aqui”, de Álvaro Pereira Junior, no suplemento Folhateen do jornal Folha de São Paulo foi extinta.
  • Ainda sobre a Folha, após duas décadas ininterruptas de balelas e caras de pau, José Sarney não figura mais entre seus colunistas.
  • Racistas de todas as cores, hora de chorar. Estudos sobre o DNA e a demografia dos hominídeos realizados nos últimos trinta anos confirmam que o homem moderno não apenas surgiu na África, como originou-se de várias miscigenações e, consequentemente, de hibridizações culturais.
  • Ministério Público estuda a possibilidade de ação contra o “humorista” Rafinha Bastos, em virtude de sua infeliz piada envolvendo estupro e mulheres feias.
  • Melanossomos (estruturas microscópicas que constituem a base do pigmento melanina) presentes em tecidos moles (pele, penas, escamas, pelos) bem preservados pode ser a chave para a reconstituição correta das cores de espécies animais pré-históricas.
  • A banda Red Hot Chili Peppers fará uma apresentação em São Paulo no dia 21 de setembro – ou seja, antes do Rock in Rio. O local será a Arena Anhembi. Ingressos à venda.
  • Marianne Steinbrecher, a Mari, está confirmada como titular da seleção brasileira feminina de vólei no próximo Grand Prix, que tem início no dia 5 de agosto.


sábado, junho 25, 2011

HOMOSSEXUALIDADE ANIMAL

Já há algum tempo venho preparando um texto sobre a homossexualidade no reino animal. Sim, ao contrário do que os mais desinformados pensam ela não é exclusividade da espécie humana. E o lançamento de A Fantástica Literatura Queer (brilhantemente idealizada e organizada por Rober Pinheiro e minha amiga Cristina Lasaitis), bem como a proximidade da Parada do Orgulho LGBT, me mostrou que nesse ano não haveria momento mais oportuno para postá-lo que agora.
Para desespero dos homofóbicos de plantão, a ciência tem descoberto um número cada vez maior de evidências da homossexualidade em outras espécies animais, além do Homo sapiens. Isso por si só já bastaria para derrubar de uma vez por todas o principal argumento daqueles que procuram justificar a homofobia, principalmente certos segmentos religiosos: a de que a homossexualidade seria "algo contra a natureza". Aliás, tal afirmação constitui justificativa das mais pobres e frágeis; uma vez que feitos como a agricultura, a prevenção de doenças, a correção de defeitos congênitos e a própria fabricação de medicamentos também são atitudes não naturais da espécie humana. O comportamento homofóbico, como toda intolerância baseada no puro preconceito, relaciona-se com uma desesperada procura de uma justificativa para o ódio injustificável. De fato, é muito mais fácil atribuir a origem de preconceitos a entes externos como Deus ou um livro sagrado que assumi-los publicamente. Se reconhecer e se assumir como um indivíduo preconceituoso requer muita coragem.
Apenas no início do século XX alguns pesquisadores pararam de fazer vista grossa para algo que julgavam imoral -
sim, sempre houve e ainda há preconceito na ciência, pois cientistas são antes de tudo seres humanos. Em 1999, o zoólogo canadense Bruce Bagemihl listou 1500 espécies de animais onde existe algum comportamento que caracteriza envolvimento sexual e/ou afetivo entre indivíduos do mesmo sexo; sendo em sua maioria (mas não apenas), mamíferos e aves. A lista é enorme: leões, golfinhos, elefantes, rinocerontes, lobos (e sua subespécie bem conhecida de todos nós, o cão doméstico), ratos, quase todas as espécies de pássaros e praticamente todos os primatas, só pra citar alguns exemplos.
Mas é preciso cautela. Tais descobertas de forma alguma evidenciam a existência de uma possível origem genética para a homossexualidade na espécie humana, como querem alguns. Na natureza a sexualidade é extremamente diversificada e em algumas espécies o comportamento homossexual se apresenta de forma bem diferente do que se observa na nossa espécie. Com base no que já se descobriu, inclusive do ponto de vista evolutivo, chega a ser ingênuo querer estabelecer uma teoria de origem comum para a homossexualidade em todo o reino animal, ou mesmo para todos os mamíferos. Tudo indica que ela apareceu mais de uma vez, de maneiras diferentes e independentes na história da sexualidade das espécies. Ou seja, não foi um acontecimento único e isolado, evoluído linearmente, mas sim vários eventos pontuais, extremamente abrangentes e multifacetados (como a própria sexualidade em si, diga-se de passagem). Sem sombra de dúvida, um tema complexo. Trabalhos multidisciplinares parece ser o caminho para compreender a homossexualidade humana e dos outros animais. Eis um campo de estudo interessante e promissor, onde muitas pistas ainda estão esperando para serem descobertas.
A seguir, apresento dez espécies onde a homossexualidade se manifesta de maneiras bem particulares:



 Bonobo (Pan paniscus) - Ao contrário dos seus parentes próximos, os chimpanzés (Pan troglodytes), os bonobos são extremamente pacíficos e pouco territorialistas; muito raramente fazendo uso de agressões físicas, seja entre membros da mesma espécie, seja com outros animais. Além disso, não apresentam o que se poderia chamar de uma hierarquia social. Mas o mais curioso são suas interações sociais: que não são estabelecidas por meio da intimidação ou da violência, como nos chimpanzés, mas sim sob formas bem mais gentis, não raras vezes fazendo uso do contato sexual. Poligâmicos, os bonobos possuem uma sexualidade extremamente variada: heterossexuais, machos com machos, fêmeas com fêmeas (caso da foto acima, o maior número de contados homossexuais registrados na espécie), machos adolescentes montando fêmeas maduras, machos adultos montando fêmeas adolescentes, fêmeas maduras masturbando jovens machos, fêmeas velhas abaixando-se delicadamente quase ao nível do chão para permitirem-se penetradas por filhotes machos. Alguns pesquisadores chegaram a afirmar que não existem bonobos fêmeas heterossexuais, mas apenas bissexuais (que seriam a maioria) ou homossexuais. Essa também é uma das diversas espécies de primatas onde se observou relações homossexuais que culminaram em algo muito semelhante ao orgasmo humano. O bonobo foi a primeira espécie, além do homem, onde se notou que o sexo não se limitava ao propósito da reprodução, incluindo sexo oral tanto nas relações hetero quanto homossexuais. O sexo nessa espécie parece ter uma importância tão ou maior que na espécie humana, uma vez que além do prazer, envolve todo um contexto social.



 "Blackbuck” (Antilopa cervicapra) - Esse ruminante asiático muda a sexualidade conforme a idade. Até o presente momento, machos adultos homossexuais são desconhecidos. Mas curiosamente, e por motivo ainda ignorado, todos os machos adolescentes (que possuem a mesma tonalidade castanha das fêmeas) são exclusivamente homossexuais, copulando entre si. Só começam a procurar fêmeas após atingirem a maturidade e adquirirem a característica coloração negra com o ventre branco dos machos adultos, que são solitários a maior parte do ano, formando haréns na época do acasalamento – como na foto acima.




Cisne Trombeteiro (Cygnus buccinator) – O maior pássaro da América do Norte, essa espécie foi equivocadamente eleita como símbolo do amor entre um homem e uma mulher, bem como da fidelidade amorosa. De fato, até algumas igrejas (incluindo a católica romana) chegaram a citar por mais de uma vez o cisne em defesa do casamento tradicional e para condenar o adultério. A grande verdade porém é que o cisne trombeteiro, bem como todas as outras espécies de cisne, não é nenhuma das duas coisas. Estudos em genética nas duas últimas décadas mostraram que, embora essencialmente monogâmicos, muitas vezes as ninhadas de cisnes têm pais biológicos diferentes do parceiro com o qual a fêmea divide os cuidados do ninho. E para sepultar de uma vez a fama desses animais como marido/esposa fiéis, geralmente esses pais biológicos são machos “comprometidos” com outras fêmeas. Também já se observou diversos contatos homossexuais em indivíduos de ambos os sexos nessas “puladas de cerca”, ainda que as mesmas sejam bem mais comuns nos indivíduos jovens, que não realizaram sua primeira postura. Cabe aqui adicionar que em virtualmente todas as espécies de pássaros ocorrem contatos homossexuais que, pelo menos entre os machos, ocasionalmente terminam em ejaculação.



Hiena Malhada (Crocuta crocuta) - Uma das características da família dos hienídeos é a presença nas fêmeas (geralmente pouco maiores que os machos) de uma bolsa escrotal oca. E o clitóris delas é enorme e alongado, muito semelhante a um pênis. Além disso, fora da época da reprodução, sua abertura vaginal permanece fechada e impenetrável. Devido a essas características bem peculiares, até meados do século XIX pensava-se que as hienas (família Hienidae) fossem hermafroditas – outra característica vista como demoníaca por alguns segmentos religiosos judaico-cristãos. Realmente, em muitos casos, só é possível distinguir o sexo de uma hiena apalpando-lhe a bolsa escrotal. Os bandos de hienas malhadas são sociedades matriarcais, lideradas por uma fêmea dominante. Há décadas registra-se um número expressivo de falsas cópulas entre fêmeas adultas e mesmo jovens. Todo ano, grupos de 2 a 4 fêmeas (muitas vezes com filhotes) se separam do resto bando e assim ficam, por períodos que variam de meses até o resto da vida, compartilhando comida e executando falsas cópulas com relativa frequência.



 Urso Pardo (Ursos arctus) – Mais precisamente, as ursas pardas. Há uma farta documentação a respeito de fêmeas nessa espécie que poderiam ser classificadas, segundo critérios humanos extremamente restritivos, como bissexuais. Ocorre que os ursos pardos (o maior predador terrestre do Hemisfério Norte) são animais solitários, sendo que os machos procuram as fêmeas apenas na época do acasalamento. O casal nem chega a conviver junto por muito tempo, ficando a fêmea como a única responsável pela criação dos filhotes – que por sinal têm os machos adultos da própria espécie como seus principais predadores. Não são raros os casos de duas fêmeas que pariram na mesma época acabarem se unindo para cuidarem juntas das suas ninhadas. O que poderia ser apenas uma “parceria de amigas com necessidades em comum” revela-se algo mais se atentarmos para o fato que em 90% desses casos elas trocam carícias e até executam falsa cópulas com contatos vaginais, não raras vezes resultando em orgasmos.




Borboletas Nynphalídeas (diversas espécies) – Essa família de borboletas inclui várias das espécies possuidoras de grandes ocelos nas asas (desenhos que lembram olhos, cujas funções vão de afugentar predadores a chamarem a atenção das fêmeas), geralmente mais desenvolvidas nos machos. Em 2010, Antonia Monteiro e Kathleen L. Prudic da Universidade de Yale realizaram um interessante estudo sobre a sexualidade desse tipo de borboleta, no qual há uma documentação expressiva sobre homossexualidade, especialmente entre fêmeas. O referido estudo foi posteriormente publicado na revista Science. As autoras estudaram o comportamento sexual de borboletas criadas a 27ºC e a 17ºC. Notou-se que nas temperaturas mais frias, as lagartas fêmeas davam origem a adultas que adotavam um comportamento mais ativo no que diz respeito à reprodução, literalmente cortejando os machos. Em algumas espécies, até os ocelos das asas, tornaram-se maiores e mais vivos. Já as lagartas de temperaturas mais elevadas originam fêmeas mais passivas, que apenas esperam o cortejo dos machos. O resultado é que as fêmeas mais ativas acabam sendo aquelas com maior sucesso reprodutivo. Além disso, é justamente nelas que se observa interações homossexuais. A grande questão é: será que as duas características possuem alguma ligação?



Argali ou Bighorn (Ovis ammon) – Esse majestoso carneiro selvagem vive numa região montanhosa que vai do Oriente Médio a Mongólia, passando pelo Himalaia. Os machos são geralmente solitários quase o ano todo, formando grandes haréns na época do acasalamento. As fêmeas vivem em pequenos grupos. Como ocorre geralmente nas espécies poligâmicas, o dimorfismo sexual é bem acentuado, sendo os machos bem maiores e com grandes cornos curvados em forma de meia lua, que usam em disputas territoriais ou por fêmeas – dos quais os maiores pares chegam a pesar 200 kg. Nessa espécie, alguns machos adultos ou jovens podem formar pequenos grupos (como o da foto acima), onde são bastante comuns contatos sexuais, incluindo lambidas na região genital resultando em ejaculações. Alguns desses indivíduos passam a vida inteira nesses grupos, nunca procurando fêmeas.



Babuíno Dourado (Papio cinocephalus) – Nessa espécie registraram-se diversos contados homossexuais em ambos os sexos. E assim como nos bonobos (vide acima), já se observou não apenas o autêntico orgasmo, como também que a vocalização das fêmeas no momento da cópula é um indicativo claro de prazer – fêmeas que fazem sexo às escondidas (como as que “traem” o grande macho dominante com outros machos do bando) costumam manter o silencio durante o ato. Hoje já se sabe que essa é uma característica comum a todos os primatas e não exclusiva da espécie humana. Embora bem mais agressivos e combativos que os bonobos, os babuínos também possuem um comportamento sexual com contexto social: a montada. Entre os babuínos há o hábito de ser virar o traseiro para os indivíduos dominantes, em sinal de submissão. E é comum entre os machos adultos a penetração anal, montando outro macho hierarquicamente inferior. Como resultado, o líder monta todos os indivíduos adultos do bando. Embora mais raros há líderes, apelidados por alguns primatólogos de "machos Nero", que também se permitem montar por outros machos hierarquicamente graduados.



Baleia Cinzenta (Eschrichtius robustus) - Na época da reprodução, grupos de machos dessa espécie de cetáceo avançam nos mares árticos em busca das fêmeas. Na verdade, nem todos. Durante o trajeto alguns machos esfregam seus corpos em outros machos, quase sempre tendo ereções. Essa troca de carícias geralmente culmina com dois ou três machos cercando um terceiro, tentando copular com este (normalmente sem sucesso) e finalizando com ejaculações. Observou-se que a maioria destes machos que participam desta brincadeira sexual não procuram fêmeas para se acasalarem.



Mosca das Frutas (Drosophila melanogaster) - Num estudo realizado em 2005, a equipe liderada pelo neurobiologista australiano Barry Dickson, do Instituto de Biotecnologia Molecular da Academia Austríaca de Ciências, em Viena; conseguiu alterar o comportamento sexual dessa espécie (uma das mais utilizadas em experimentos científicos) apenas mexendo no seu código genético. Para isso alteraram o gene conhecido como "fruitless" ou "fru", considerado a central para o acasalamento, envolvida no ritual de corte dos machos. Notou-se então que as fêmeas alteradas começaram a procurar outras fêmeas e até a tentar copular com elas; enquanto os machos alterados passaram a se comportar como fêmeas em relação aos outros machos. Esse experimento esquentou ainda mais o debate sobre uma possível origem genética da homossexualidade. Contudo, cabe esclarecer que nos vertebrados, ao contrário do que ocorre nos insetos, não são os cromossomos que determinam a sexualidade. Na verdade ela estaria muito mais relacionada com os hormônios. Ainda assim, muitos estudiosos defendem que essa influencia seria apenas parcial – prova disso é que lésbicas não apresentam necessariamente altos níveis de testosterona, por exemplo.



sexta-feira, junho 10, 2011

NÃO, MULHER NÃO É TUDO VACA


Participantes da Slut Walk São Paulo com seus cartazes (por Tchello).

Na tarde do último sábado realizou-se na Avenida Paulista a Slut Walk (“Marcha das Vadias”) de São Paulo, versão de um evento que teve origem no Canadá, quando universitárias da cidade de Toronto, ao reclamarem do alto índice de estupros, receberam como resposta do xerife local a afirmação de que suas vestimentas inapropriadas e provocativas teriam motivado tais crimes. A Marcha surgiu como reação a esse pensamento machista; procurando alertar a sociedade para a verdadeira cultura do estupro na qual vivemos. Todo aquele que já atentou para o assunto certamente notou as inúmeras vezes em que se procurou criminalizar as mulheres vítimas de violência sexual. “Ela provocou” ou “Ela estava usando roupa curta, quase nua”, são algumas das “justificativas” mais comuns, pra não falar em outras bem mais específicas, como “Ela era uma vagabunda mesmo, merecia” (acreditem, eu já ouvi isso).
Hoje retomo o blog deixando a evolução biológica de lado (ao menos parcialmente) e abordando esse tema, tão espinhoso quanto urgente. Por motivos de força maior, não pude comparecer ao evento, o que já me desqualifica para comentá-lo. Contudo, na qualidade de indivíduo do sexo masculino que gosta muito de mulher (e não apenas de sexo com mulher), acredito poder comentar as motivações do mesmo, bem como o que pude acompanhar depois do seu término. Antes da Marcha li vários textos sobre o tema, alguns excelentes. Mas todos escritos por mulheres. Nada mais justo, pois ninguém melhor que o discriminado para discorrer sobre a discriminação sofrida. Mas confesso que senti falta de uma opinião masculina sobre o assunto. Àqueles que por ventura tiverem curiosidade sobre a minha visão das mulheres, sugiro a leitura do meu post do Dia Internacional da Mulher deste ano.
O que salta aos olhos ao percorrermos os sites de notícias de sábado pra cá é o número nada desprezível de gente que não entendeu absolutamente nada da “Marca das Vadias”. Teve até quem achasse tratar de uma passeata de profissionais do sexo desocupadas. A essas criaturas, só me resta a minha sempre viva vergonha alheia. Infelizmente, esses tipos sempre existirão. Trata-se de um sintoma clássico dos garotos digitais do século XXI, como diz aquela música do Bad Religion: um bando de “especialistas” que leem superficialmente sobre tudo, não entendem realmente nada e sempre ávidos pra vomitar suas ridículas opiniões baseadas em orelhadas e Wikipedia. E há ainda aqueles que claramente nada tem a dizer e querem apenas aparecer – curiosamente, muitas vezes ocultos sob o anonimato.
Mas o que realmente merece atenção é a opinião de gente que entendeu a Marcha e mesmo assim a condena por considerá-la apologia a pornografia, a promiscuidade e a “pouca vergonha” – o que para alguns significa a liberdade feminina. Ou que acha que as mulheres brasileiras deveriam preocupar-se com “assuntos mais importantes”. Mesmo não sendo mulher, me arrisco em perguntar o que seria mais importante pra uma delas que ser dona do seu próprio corpo, o seu templo, numa sociedade em que homens ditam regras a respeito do que e como ela deve fazer com ele. Aqueles que pensam assim geralmente são os mesmos que acham que a Lei Maria da Penha trás privilégios às mulheres – como se em algum momento da nossa história elas tenham sido tratadas em condição de igualdade com os homens. Trata-se apenas de mais uma forma de tentar legitimar a violência sexual contra a mulher, expressa desde em brincadeiras aparentemente inocentes (como a já famosa e pra lá de infeliz piada de Rafinha Bastos sobre estupro e mulheres feias e uma comunidade virtual que pede a “legalização do estupro”) até o argumento (pífio, pra não dizer patético) no qual uma mulher que não quer ser atacada, então que se vista “decentemente” e “se dê ao respeito”. Como homem, gostaria de me aprofundar nessa vergonhosa opção de bater insistentemente nessa tecla, defendida por alguns dos meus pares (e até mesmo algumas mulheres) da espécie.
Comecemos pelo mais evidente: a questão do vestuário. Então uma mulher, para evitar ser estuprada, não pode usar saias curtas ou decotes, sob o risco de “provocar”? Engraçado que ninguém diz o mesmo a respeito dos homens de perna de fora e torso nu – salvo se ele for afeminado, situação em que ele vira a “bichona louca”, o viado que (mais uma vez) “não se dá ao respeito”. Homem com as pernas de fora é elogiado. Mulher de perna de fora vira vadia. Sabemos que na nossa sociedade não precisa muito para uma mulher virar vadia. Basta, por exemplo, ter ficado com mais de um garoto na adolescência; ou ter mais experiências sexuais que seu futuro marido. Quando o assunto é homem x mulher, a cultura de “dois pesos e duas medidas” fala alto, ou melhor, grita. E já que é pra cutucar a ferida, vamos ao extremo dos extremos: os maníacos estupradores, aqueles cujo comportamento é decorrente de uma doença mental. Para esses indivíduos, pouco ou nada importa a roupa que a sua vítima está usando. Muitas vezes, sequer ela precisa ser atraente. Basta ser mulher. O que realmente preocupa é o fato dessa desculpa dos trajes femininos partir justamente daquela parcela da população considerada mentalmente sã. Isso ficou evidente no episódio protagonizado pela universitária e agora pseudocelebridade Geisy Arruda – ou alguém realmente acredita que a machaiada urrante do lado de fora da sala de aula queria apenas agredi-la verbalmente? A polícia não estava lá por brincadeira. Sim, digo mais uma vez, vivemos uma cultura do estupro. Só não vê quem não quer.
Sobre a questão do “se dar ao respeito”, acredito seriamente que isso tem muito mais a ver com comportamento que com visual. Um comportamento vulgar faz qualquer indumentária perder toda a primazia de atenção. E cá entre nós, todos já topamos com mulheres vestidas dos pés à cabeça muito menos respeitáveis (em todos os sentidos) que aquelas que usam saia acima dos joelhos em dias de calor. Sem falar que, com exceção óbvia dos extremos, a questão da vestimenta é muito subjetiva dentro da nossa cultura – comentar agora a (des)importância das roupas em outras culturas só complicaria a situação, além de desviar o foco do post. Uma calça que para alguém é muito justa e chamativa pode parecer discreta para outro.
Agora, o que me arranca gargalhadas, a ponto de doer o meu diafragma são os argumentos daquela minoria que defende o estupro como algo natural e, portanto, aceitável. Sim, eles existem. E mais que ativar a vergonha alheia, são tipos dignos de pena. Esclarecendo, é sabido que o estupro não é exclusividade da espécie humana, ocorrendo em diversas outras espécies entre mamíferos (como gorilas e leões), aves (especialmente as diversas espécies de pato) e até em alguns caranguejos. “E daí?”, perguntarão alguns leitores, com toda razão. Daí que esses indivíduos utilizam tais fatos para justificar a violência contra a mulher. Tal analogia é por demais deficiente uma vez que, ainda que nos dois casos esteja presente a atração física, os motivos centrais da violência sexual no Homo sapiens e noutros animais são bem distintos: enquanto nas outras espécies a intenção é darwinianamente reprodutiva, na nossa ela é claramente de domínio sobre o outro - geralmente, sobre a outra. E para aqueles que ainda acreditam que nossos ancestrais dos tempos das cavernas conseguiam apaziguar seus desejos carnais apenas na base dos sopapos e puxões de cabelo, sugiro abandonar os filmes, desenhos animados e livros de quarenta anos atrás e dar uma lidinha em textos mais recentes sobre a sexualidade humana. Diferente da cultura que hoje domina o planeta, as primeiras sociedades humanas eram igualitárias quanto aos gêneros – e não, não havia o domínio do feminino sobre o masculino, como querem alguns neopagãos analfabetos em história (para maiores detalhes nesse sentido, sugiro meu texto Sobre Fé, Divindades e Epiderme). Descobertas feitas nas últimas duas décadas mostram que, ao contrário do que diz o senso comum, o sexo não consensual nas primeiras populações da nossa espécie além de ser a exceção, em muitas delas gerava punições. Nota-se que a violência sexual só é tolerada em culturas onde a mulher ocupa uma posição de inferioridade em relação ao homem. E a nossa é um exemplo bem palpável.
Apenas não concordei com ao fato da Marcha terminar na figura do “humorista” Rafinha Bastos. A meu ver, isso acabou por descaracterizar o seu propósito original que, como vimos, é muito mais abrangente. Aproveito para informar que, ao manifestar meu repudio a respeito da referida piada do mesmo, alguns me acusaram de defender o politicamente correto. Quem me conhece sabe que de politicamente correto não tenho nada, muito pelo contrário. O problema é que hoje ser politicamente incorreto virou “cool”, todo mundo quer. Mas como em tudo na vida, a maioria que o tenta consegue apenas ser idiota. E a piada desse cidadão (que como afirmei em outra oportunidade, não me representa como nerd, muito menos como homem) não foi politicamente incorreta, mas apenas idiota. É considerado humor politicamente incorreto aquele que mexe em temas considerados perigosos, mas que estão repletos de fontes para diversos tipos de anedotas e similares. Uma piada inteligente (ainda que pesada) envolvendo racismo ou homofobia, antes de mais nada, ilustra a imbecilidade que constitui tais comportamentos – os saudosos Trapalhões e TV Pirata que o digam. Agora, alguém sem histórico psiquiátrico consegue ver algo de engraçado no tema estupro? Ao menos essa infeliz piada teve sua importância como documento histórico: ilustra muito bem a mentalidade atual do brasileiro.
É preciso esclarecer que não cabe aqui qualquer forma de generalização. Há mulheres dos mais diversos tipos de caráter, assim como ocorre com os homens. Sim, algumas não se dão ao respeito. Sim, há aquelas que não valem uma nota falsa de um real. Mas isso não é de forma alguma justificativa para agredi-las sexualmente. Se você, caro espécime Homo sapiens do sexo masculino pensa que sim, já começou errado. Da mesma forma que espancar um homossexual não o torna mais hétero, estuprar uma mulher de caráter duvidoso não o torna mais viril. Definitivamente, não é essa a questão.
Vendo as fotos da Slut Walk de São Paulo, o cartaz que mais me chamou a atenção foi um onde se lia “Respeite as mulheres, se for homem”. Simplesmente perfeito. As frases mais simples e diretas são mesmo as melhores. O homem brasileiro é ensinado desde cedo a ver a mulher como mero objeto de prazer e que gostar delas seria sinônimo de fraqueza. Macho que é macho não trata bem mulher – quem faz isso é otário, é assim que aprendemos. E nossa sociedade está cheia de machos. Mas nem todo aquele que nasce macho se torna homem. As mulheres que valem a pena teem toda a razão de reclamar: homem está mesmo em falta.


Obs: O título deste post faz referência à letra de “Mãe é Mãe”, composição de Cláudio Besserman Vianna (1962-2006), mais conhecido como Bussunda. Maiores detalhes a respeito da mesma podem ser vistos na sua biografia, escrita por Guilherme Fiuza.

segunda-feira, abril 11, 2011

O PILAR FUNDAMENTAL DO CRIACIONISMO


Num post publicado em novembro do ano passado (Sobre o Criacionismo) procurei definir o criacionismo e apontar as suas principais características junto ao leitor não especializado, bem como apresentar as formas de desonestidade intelectual, empregadas por alguns dos seus adeptos, com o intuito de fazer parecer que esse embuste tenha algum fundamento. Também me senti na obrigação de esclarecer no mesmo texto que é perfeitamente possível ter uma fé e aceitar a evolução dos seres vivos, desde que a mesma não exclua esse fato. Fé é ciência não precisam ser inimigas, ao contrário do que pregam fanáticos de ambos os lados. Hoje, venho abordar aquilo que não apenas move como também sustenta todo o pensamento criacionista. Por que existem pessoas que se recusam com tamanha veemência a aceitar o fato mais que comprovado da evolução biológica? Em que se fundamenta a doutrina criacionista? Na fé? De certa forma, sim. Mas trata-se, contudo, de um tipo bem específico de fé. Quando se aborda esse tipo de assunto deve-se evitar ao máximo o caminho perigoso das generalizações e rótulos. Podemos iniciar pela leitura do trecho que se segue:

"Isso é totalmente contrário ao que ensina a Bíblia. Sabemos que somos a excelência da criação, que fomos criados um pouco menores que os anjos, que fomos feitos à imagem e semelhança de Deus. Mas a evolução nos ensina que somos apenas mais uma espécie na natureza. Não posso acreditar na evolução e me considerar um primo, ainda que distante, das baratas."

A afirmação acima faz parte de uma “apostila” que chegou às minhas mãos em 2004, onde o biólogo criacionista (sim, eles existem, por mais contraditório que isso seja) Marcos David Muhlpointner tenta refutar as bases da teoria da evolução biológica. Cheguei a comentar o conteúdo da mesma no antigo endereço deste blog, algo que hoje consideraria desnecessário. Independente de tal episódio é importante notar que a passagem destacada ilustra de maneira bem clara e direta a força motriz do criacionismo. O que motiva um criacionista a manter sua fé nada mais é do que a necessidade de se sentir como uma criatura especial e superior a todas as demais. A espécie favorita do Criador. Numa cultura onde essa visão de mundo predomina, qualquer oposição supostamente embasada à idéia do ser humano como apenas mais um animal cai como uma luva, servindo como porto seguro, ainda que totalmente ilusório, a quem compartilha dela.
Cabe esclarecer que, embora tal forma de fé seja uma característica fundamental de certas religiões pentecostais e neopentecostais, outras formas de monoteísmo não a levam tão ao pé da letra. Na verdade, a maioria das religiões do tronco judaico-cristão aceita a evolução biológica sem problemas. Mas o criacionismo soube muito bem potencializar o conceito e expandir as fronteiras dessa crença na superioridade humana, baseando-se em parte no fato da Reforma Protestante defender (e pregar desde então) uma interpretação literal e não metafórica dos textos sagrados – prometo abordar essa questão num post futuro. Chega a ser engraçado perceber como essa suposta literalidade acabou criando toda uma nova horda de símbolos e metáforas, cujos detalhes este biólogo, reconhecendo seus limites, prefere deixar a cargo dos estudiosos da semiótica e áreas correlatas.
A verdade é que, via de regra, criacionistas claramente enxergam na teoria da evolução biológica, antes de qualquer coisa e não raras vezes de maneira inconsciente, uma ofensa pessoal. Por ser uma teoria científica e justamente por isso mostrar as coisas como elas realmente são (nesse caso o ser humano como apenas mais uma espécie na natureza), independente disso ser agradável ou não, ela vai de encontro à idéia propagada por alguns líderes religiosos de que a humanidade seria a obra favorita de Deus. Para um criacionista, ser considerado um animal ou mesmo comparado com os outros animais é a maior das afrontas. A coisa se torna ainda pior quando esses animais são do tipo que pouca gente vê alguma beleza, como as baratas e, especialmente, os grandes símios (bonobos, chimpanzés, gorilas e orangotangos). Preferem ver a si mesmos como especiais e separados da natureza, sobre a qual teriam plenos poderes concedidos por sua divindade. Isso já explica quase que por completo a resistência em aceitar a evolução biológica por parte desses indivíduos: orgulho e soberba infantis, levados às últimas conseqüências. São como aquelas crianças mimadas e inseguras, que precisam se sentir o(a) filho(a) ou aluno(a) preferido(a) para serem felizes. Afirmações famosas da retórica criacionista como “eu não vim do macaco” ou “o ser humano não é apenas um chimpanzé evoluído” refletem tanto esse egocentrismo quanto o desconhecimento dos fundamentos mais básicos da biologia – lembrando que falta de conhecimento é algo sempre conveniente quando o objetivo é a manipulação. Ao mesmo tempo, é importante lembrar que faz parte do comportamento criacionista acusar os cientistas de arrogância. Trata-se da projeção psicológica mais uma vez se revelando como uma ferramenta recorrente.
O fato é que, gostando ou não, somos primatas (e como tais, descendemos de outros primatas), como primatas somos mamíferos, como mamíferos somos vertebrados, e como vertebrados somos animais – os conhecedores de taxonomia notarão que exclui propositalmente vários grupos nessa escala lineana simplificada; o objetivo aqui é poupar os leitores não familiarizados com o assunto de um incômodo desnecessário. Temos 98% de semelhança genética com os chimpanzés (Pan troglodytes), doa a quem doer. Nenhuma pregação enfurecida mudará esse fato. E mais: a ciência já provou que não somos a única espécie animal dotada de características como consciência, emoções e raciocínio. E nem me refiro especificamente aos símios nesse caso. Qualquer graduando que já teve a oportunidade de realizar um experimento comportamental utilizando ratos sabe muito bem o que quero dizer. O número de semelhanças da nossa espécie com as outras é muito maior do que as diferenças, para desespero dos defensores do “um pouco menores que os anjos” (esses por si só uma grande projeção antropocêntrica). E esse número aumenta em progressão geométrica quando se aproxima o parentesco: temos mais em comum com um cão que com uma jibóia e, por sua vez, muito mais em comum com um macaco prego que com os cães.
A maior semelhança entre alguns tipos de seres vivos em comparação com outros constitui evidencia óbvia da evolução. Se, como os criacionistas defendem, ela não existisse, todas as espécies teriam o mesmo grau de semelhança: todos muito parecidos ou todos muito diferentes entre si. A variabilidade (e aqui incluo obviamente a variabilidade genética) é uma prova cabal da evolução. Sem evolução parentescos não existiriam – ou todas as espécies teriam o mesmo grau de parentesco, dependendo da abordagem. Só não vê quem não quer. E sabemos quanto o fanatismo é capaz de cegar.
Uma das maiores “pérolas” criacionistas atribui à fala uma prova clara da superioridade humana. Gostam de repetir feito mainás histéricos (trocadilho proposital) que nenhum outro primata se tornou capaz de conseguir o mesmo, o que evidenciaria o fato do Homo sapiens ser uma criatura especial. Afirmam ainda que tal característica seria uma evidência da imensa superioridade e divina complexidade do cérebro humano. Entretanto, biólogos sabem que gorilas e chimpanzés são incapazes de falar não por uma suposta inferioridade cerebral (cabe aqui frisar que neurocientistas comparam o cérebro desses símios com os de crianças de 2-3 anos, ou seja, idade onde em geral a linguagem falada já se encontra plenamente desenvolvida), mas sim pelo seu aparelho vocal, que é bem mais limitado que o nosso. E lembrando que não foram poucos os chimpanzés e gorilas que, devidamente estimulados e condicionados, aprenderam a se comunicar com seres humanos de maneira não falada, incluindo linguagem de sinais. Indo mais longe: a complexidade anatômica do cérebro humano (ainda que não seja confiável utilizar tal característica isolada para inferir a capacidade cerebral de um animal) não é superior a de algumas espécies de baleias e golfinhos (capazes, entre outras coisas, de ações planejadas). E indo mais longe ainda: experimentos com algumas espécies de papagaio mostraram espantosa correlação entre suas frases e suas ações (e por que não dizer, intenções?), revelando assim que não são meros repetidores de palavras. Mais uma vez, as semelhanças suplantando as diferenças.
Notem que no trecho citado no início deste post o autor declara “não poder acreditar na evolução”. Dentro do festival de falácias e distorções de fatos que lhes é comum, alguns criacionistas gostam de acusar os biólogos que lidam com evolução de defenderem uma crença, algo que careceria de qualquer embasamento real – mais uma vez a projeção. Todo cientista, biólogo ou não, sabe que uma teoria não é (ou ao menos não deveria ser) elaborada para se acreditar nela, uma vez que a mesma se baseia em evidências e não na fé (ver meu texto Ciência e Trabalho Científico). Claro que a contingência histórica influenciou (e provavelmente ainda influencia) muitos cientistas na elaboração das suas teorias, algumas das quais se mostraram incorretas posteriormente (apresentei um exemplo em Os Moluscos de Leonardo da Vinci). Mas usar esse argumento para desacreditar uma teoria científica caracteriza ou uma ingenuidade digna de pena ou uma desonestidade atroz. Seria o equivalente a desacreditar toda a engenharia por um episódio de edifício mal construído. A única maneira de se refutar uma teoria é por meio de outra teoria, coisa que sabemos que o criacionismo está muito longe de ser, pois se baseia única e exclusivamente numa forma de fé. Não há qualquer evidencia que sustente a “ciência da criação”. Já a evolução biológica está repleta de evidencias que podem ser facilmente verificadas em qualquer biblioteca, livraria ou museu. Mais uma vez, só não vê quem não quer.
Conclui-se, portanto, que o alicerce fundamental da fé criacionista é um só e, diga-se de passagem, extremamente frágil. Talvez por isso alguns dos seus seguidores atuem de maneira tão desesperada e por vezes agressiva para que o mesmo não seja definitivamente demolido. Para essas pessoas, se tal pilar ceder o seu mundo desmoronará junto. De fato, constitui um choque muito grande se descobrir como nada superior ou favorito entre as demais criações da natureza. Mas como denota a própria etimologia da palavra desilusão; algumas vezes é preciso destruir ilusões para enxergar as coisas como realmente são. Infelizmente, certas mentiras são por demais confortáveis. Por outro lado, nada disso pode negar que somos uma espécie bem peculiar e de fato muito interessante: um macaco bípede, pelado e neotênico, cuja criatividade e adaptabilidade só se equiparam à sua prepotência.
O egocentrismo humano terminou por nos presentear com a falsa impressão de que a natureza nos pertence e que tem a obrigação de nos agradar. Mas nós é que somos parte dela, que simplesmente é como é; sem nos dever qualquer satisfação por isso. O universo não está nem aí pra nossa mania de grandeza. Goste ou não, a evolução biológica ocorre, assim como a translação da Terra em torno do Sol e os movimentos das partículas elementares da matéria. Àqueles com dificuldade em aceitar essa realidade eu, como criatura cheia de vícios de comportamento e longe de possuir grandes conhecimentos só posso sugerir um ato que, há bem pouco tempo, equivocadamente se tinha como exclusividade da nossa espécie: senta e chora.

Bibliografia recomendada:
ARNOULD, Jacques, A Teologia Depois de Darwin, Edições Loyola, 2001.
DAWKINS, Richard, O Maior Espetáculo da Terra; As Evidências da Evolução, Companhia da Letras, 2009.
FUTUYMA, Douglas J., Biologia Evolutiva, FUNPEC, 2003.
GOULD, Stephen Jay, Hen’s Teeth and Horse’s Toes, W.W. Norton, 1983.
ZIMMER, Carl, O Livro de Ouro da Evolução: O Triunfo de Uma Idéia, Ediouro, 2003.



terça-feira, abril 05, 2011

SEREIAS

Aviso aos que ainda não assistiram: Contém Spoilers

Depois dos dragões foi a vez das sereias. Mês passado, o canal Animal Planet apresentou um novo e interessante exercício de imaginação sob a forma de documentário ("mockumentary", no jargão cinetelevisivo). Desta vez o exercício consistia em mostrar como seriam as sereias se elas realmente existissem. Inspirado no mistério envolvendo um curioso tipo de som provindo dos oceanos (apelidado de “bloop”) e partindo de uma suposta validade da hipótese do macaco aquático (que como o próprio nome deixa bem claro, nem chega a constituir uma teoria do ponto de vista científico, pela carência de evidências), é mostrado que animais desse tipo poderiam evoluir para primatas totalmente adaptados ao ambiente marinho, à semelhança do que ocorreu milhões de anos antes com outros grupos de mamíferos, como o que deu origem as baleias (ver meu texto O Urso Nadador de Charles Darwin). Prometo abordar a hipótese do macaco aquático num post futuro, pois a mesma não deixa de ser interessante.
Até por serem criaturas bem menos fantásticas e poderosas, as sereias em questão ficaram muito mais verossímeis que os colossais dragões, apresentados no primeiro “documentário” do gênero, em 2004. As explicações “científicas” para o seu surgimento, evolução e hábitos são totalmente coerentes do ponto de vista biológico – a nadadeira caudal, por exemplo, teria se desenvolvido de forma muito semelhante ao que ocorreu no grupo de mamíferos aquáticos denominados sirênios (acertou quem concluiu que o nome origina-se justamente da palavra siren = “sereia”), a qual pertence o nosso peixe boi. Esses seres seriam perfeitamente possíveis se o referido macaco aquático (lembrando que não há qualquer indício da sua existência, o que o torna também uma espécie fictícia, portanto) tomasse tal rumo evolutivo. A própria abordagem ficou mais lúcida e menos forçada – confesso que ainda tenho dificuldades em aceitar aquela desculpa para explicar como animais de anatomia tão solidamente quadrúpede e pesada como os dragões dos mitos ocidentais poderiam voar. E não, não dá pra comparar com os pterossauros, cuja anatomia responsável pelo voo é completamente diferente. Lembro-me de, na época do episódio dos dragões, tomar conhecimento de pessoas de todas as idades que começaram a acreditar que essas criaturas realmente teriam existido, em virtude do programa. Entretanto, mesmo com toda a melhora, a maneira realista com que tudo ainda é montado torna difícil para os mais desavisados distinguir o que é real da pura ficção. Enquanto escrevo este post, já li vários comentários e textos na internet de gente achando que as tais sereias são reais, chegando a invocar conspirações (parece que algumas pessoas teem verdadeiro fetiche por elas) para justificar suas crenças. Esse seria talvez o único ponto negativo da série. Um aviso no início do mockumentary explicando que tudo aquilo é fictício só ajudaria. Do jeito que está, fica parecendo uma das obras de Dan Brown.
Cabe ressaltar aqui que o mockumentary caracteriza também uma denúncia. E nesse ponto eles acertaram na mosca. Não é preciso ser nenhum gênio ou especialista em mensagem subliminar para notar que ali se encontra uma maneira de mostrar (aliada a uma ficção que inteligentemente não atrapalha tal avaliação) os danos causados à vida marinha por certos tipos de testes envolvendo a tecnologia utilizada nos sonares (representado logo no início pelas baleias encalhadas). No programa, as sereias teriam participação nisso – uma bela ilustração da tendência humana de culpar outros por suas mazelas. Independente da origem do “bloop” continuar um mistério, não há como negar essa realidade. A meu ver, uma ótima sacada.
Além de refletir uma criatividade primorosa, a série é uma ótima ferramenta para dar uma idéia aos leigos de como a ciência funciona, fazendo o público pensar – algo cada vez mais raro hoje, mesmo na TV paga. Sem falar na já mencionada denúncia presente neste em especial. Para quem ainda não viu, seguem abaixo os vídeos da versão em português do programa. Praqueles que preferirem, no próprio Youtube há versões em espanhol, bem como o original em inglês (ambos, até o presente momento, sem legendas).











sexta-feira, abril 01, 2011

10 INDÍCIOS DE QUE VOCÊ É UM PSEUDONERD



Baseados nuns tipos reais que andei trombando por aí.

  1. Você só decidiu virar nerd porque percebeu (ou mais provavelmente, alguém te falou) que “hoje em dia ser nerd é legal, pega bem e dá status”.
  2. Pra você, ser nerd é basicamente uma questão de visual, bastando usar óculos estilosos (mesmo não sendo míope), se fantasiar em encontros temáticos ou ter uma das camisetas do Sheldon do Big Bang Theory pra ser considerado um nerd.
  3. Se diz fã de ficção científica, mas não faz a menor idéia de quem sejam Isaac Asimov, Arthur C. Clarke, Ursula K. Le Guin ou Ray Bradbury.
  4. Você odeia Watchmen por não conseguir entendê-lo. E não tem a menor vontade de entender. Na verdade, você não tem a mínima vontade de entender nada. Estudar qualquer coisa, pra você, é um martírio.
  5. Você adorou os Batmen de Joel Schumacher, Superman Returns e as adaptações cinematográficas de Elektra e Catwoman.
  6. Acha que Avatar merecia levar o Oscar de Melhor Filme.
  7. Seus escritores favoritos são Dan Brown e Paulo Coelho.
  8. Na sua vida amorosa, nerds são justamente o tipo de pessoa que não te desperta o menor interesse.
  9. Compra quilos de produtos em eventos ou lojas do gênero (especialmente se estiver na companhia de verdadeiros nerds) sem nunca fazer uso dos mesmos – livros e revistas, por exemplo, dificilmente serão lidos.
  10. Tem verdadeiro pavor de parecer nerd fora dos encontros e eventos.


segunda-feira, março 21, 2011

METAFÍSICA

Por Luis Fernando Verissimo

Quando Einstein morreu foi para o céu, o que o surpreendeu bastante. Assim que chegou, Deus mandou chamá-lo.
-Einstein! - exclamou Deus quando o avistou.
-Todo-Poderoso! - exclamou Einstein, já que estavam usando sobrenome. E continuou:
-Você está muito bem para uma projeção antropomórfica da compulsão monoteísta judaico-cristã.
-Obrigado. Você também está ótimo.
-Para um morto, você quer dizer.
-Eu tinha muita curiosidade em conhecer você - disse Deus.
-Não me diga.
-Juro por Mim. Há anos que Eu espero esta chance.
-Puxa...
-Não é confete, não. É que tem uma coisa que Eu queria lhe perguntar...
-Pois pergunte.
-Tudo o que você descobriu foi por estudo e observação, certo?
-Bem...
-Quer dizer, foi preciso que Eu criasse um Copérnico, depois um Newton etc, para que houvesse um Einstein. Tudo numa progressão natural.
-Claro.
-E você chegou às suas conclusões estudando o que outros tinham descoberto e fazendo suas próprias observações de fenômenos naturais. Desvendando os meus enigmas.
-Aliás, parabéns, hein? Não foi fácil. Tive que suar o cardigã.
-Obrigado. Mas a teoria geral da relatividade...
-Sim?
-Você tirou do nada.
-Bem, eu...
-Não me venha com modéstia - interrompeu Deus. - Você já está no céu, não precisa mais fingir. Você não chegou à teoria geral da relatividade por observação e dedução. Você a bolou. Foi uma sacada. É ou não é?
- É.
-Maldição! - gritou Deus.
-O que é isso?
-Não se escapa da metafísica! Sempre se chega a um ponto em que não há outra explicação. Eu não agüento isso!
-Mas escuta...
-Eu não agüento a metafísica!
Einstein tentou acalmar Deus.
-A minha teoria ainda não está totalmente provada...
-Mas ela está certa. Eu sei. Fui eu que criei tudo isso.
-Pois então? Você fez muito mais do que eu.
-Não tente me consolar, Einstein.
-Você também criou do nada.
-Eu sei! Você não entendeu? Eu sou Deus. Eu sou a minha própria explicação. Mas você? Você não tem desculpa. Com você foi metafísica mesmo.
-Desculpe. Eu...
-Tudo bem. Pode ir.
-Tem certeza que não quer que eu...
-Não. Pode ir. Eu me recupero. Vai, vai.
Quando Einstein saiu, viu que Deus se dirigia para o armário das bebidas.


Originalmente publicado na revista Veja, na edição de 11 de maio de 1988.


segunda-feira, março 14, 2011

SOBRE DESASTRES NATURAIS E O ANTROPOCENTRISMO

Imagem do tsunami que varreu a costa nordeste do Japão, na última sexta feira.

Fenômenos naturais de considerável magnitude, especialmente quando fazem vítimas, costumam suscitar além de alerta e comoção, questionamentos diversos. Não poderia ser diferente com o terremoto (o maior da história do país), seguido de um tsunami de cerca de dez metros de altura e mais de 350 tremores secundários, ocorridos na região nordeste do Japão no último final de semana – escrevo este texto no final da noite de domingo e acabo de saber da aproximação do segundo tsunami e da explosão na usina nuclear em Fukushima. Entre as várias questões levantadas sobre essa tragédia, talvez a mais visível seja a sugestão de que a proximidade de tantos fenômenos semelhantes (como os terremotos recentes do Chile e do Haiti) sejam consequência da degradação ambiental promovida pelo ser humano.
Minha experiência como professor bem como minhas incursões na área de educação ambiental tem me revelado um número cada vez maior de pessoas muito bem intencionadas, mas repletas de informações equivocadas sobre os mais diversos assuntos. E isso, é sempre bom esclarecer, independente da escolaridade ou “nível cultural”. Nos últimos dois dias, lendo as seções de e-mails e cartas dos jornais de grande circulação, notei essa idéia de que terremotos e maremotos teriam sua origem na ação humana aparecendo com relativa frequência. Num deles, até um colunista dizia pensar o mesmo, ainda que com assumida e sensata cautela. Não obstante o quão importante é constatar o crescimento da consciência ambiental na população mundial como um todo nas últimas duas décadas, tal idéia não faz o menor sentido. Influenciada em igual medida pela onda do politicamente correto (especialmente, mas não apenas, no Brasil), o ecoterrorismo inconsequente de alguns grupos e a formação sistemática de uma horda cada vez maior de indivíduos que possuem um grande número de informações superficiais sobre quase tudo sem conhecer realmente nada (naquele que talvez seja o maior efeito colateral da velocidade vertiginosa com que a informação circula hoje), a defesa de que o homem seria o principal responsável por tudo que mata os seus semelhantes vem ganhando força. Os mais exaltados chegam a enxergar “sinais” em tais eventos. Nos parágrafos seguintes, tentarei expor os três principais motivos que explicam porque o homem nada tem a ver com a origem ou causas de tais fenômenos. Na verdade, trata-se basicamente de uma falsa impressão, originada da tendência humana de não olhar para nada além do seu próprio umbigo.
Começarei pela força motriz de tudo isso: a natureza. Está acontecendo mais tremores e tsunamis hoje que em qualquer outra época, certo? Errado. Na verdade o estudo sobre a movimentação das placas tectônicas vem mostrando que o número de tremores e eventos relacionados, como erupções vulcânicas, tem diminuído ao longo da história da Terra. A grande questão é que quando eles ocorriam em maior número, ou ainda não existiam no planeta pessoas para presenciá-los ou elas ainda eram em número bem menor e viviam em grupos dispersos. Lembremos que nossa espécie está aqui há pouco mais de 100 mil anos, dentro dos 4,5 bilhões de anos de existência da Terra e 3,6 bilhões de anos de vida na mesma. Ou seja, em termos geológicos, chegamos aqui ontem. Inclusive, alguns dos grandes episódios de extinção em massa no nosso planeta (foram cinco ao todo) tiveram sua origem exclusivamente em eventos internos. E nem me refiro àquele velho conhecido da cultura popular (a extinção cretácio-terciária, há 65 milhões de anos, que vitimou os dinossauros e diversos outros tipos de animais e plantas – esses últimos quase sempre omitidos pela imprensa e esquecidos do grande público), tendo em vista que ainda há um intenso debate em torno de que a causa do mesmo teria sido ou não um agente externo – a título de esclarecimento, não há dúvidas que ocorreu o célebre impacto de um enorme meteoro, mas alguns especialistas sustentam que a extinção já se fazia presente quando ele ocorreu, configurando-o como apenas um “golpe de misericórdia”. O que a maior parte do público não especializado desconhece é que antes do aparecimento dos dinossauros e do grupo ao qual pertencemos (os mamíferos) a vida no nosso planetinha azul literalmente quase desapareceu. Há cerca de 230 milhões de anos, a extinção permo-triássica dizimou 90% dos seres que viviam em terra, rios, lagos e oceanos. Sem dúvida, uma cifra que faz as últimas catástrofes naturais registradas parecerem fichinha. Nunca houve na Terra mortandade sequer próxima disso – a extinção cretácio-terciária levou cerca 60% dos seres vivos de então. E, obviamente, causada por eventos naturais.
Conforme abordei no meu texto Sobre Fé, Divindades e Epiderme, a cultura predominante nas nações ocidentais (e que hoje influencia também boa parte do Oriente) tende a ver o ser humano como o centro do universo e um ente externo aos outros aspectos naturais. Tudo existe em função ou foi feito para o deleite da espécie humana. A essa visão de mundo damos o nome de antropocentrismo (de anthropos = "homem" ou "humano"). Mesmo com a maior consciência ecológica atual, a maioria das pessoas vê a humanidade como algo especial entre as outras criaturas. Basta notarmos o grande número de pessoas sabidamente de boa índole que não aceitam de forma alguma serem comparadas aos outros animais, quanto mais saber que é um animal. Por vezes esse antropocentrismo se manifesta de forma sutil e até inconsciente, com o indivíduo excluindo automaticamente da sua memória todos os eventos catastróficos que não inclua outros seres humanos. Isso explica, em parte, essa sensação enganosa de que acontecem mais terremotos, maremotos, erupções vulcânicas e eventos similares hoje que em outras épocas.
Outro fator importante é a diferença da quantidade de informação e a velocidade com que a mesma circula hoje do que era feito há duas ou três décadas. Atualmente recebemos todo tipo de conteúdo, de qualquer parte do mundo, em questão de segundos. E numa quantidade tão grande que é simplesmente impossível assimilarmos tudo, sendo obrigados a selecionar aquilo que seria realmente útil ou de interesse mais urgente. No século XIX notícias importantes poderiam demorar mais de duas semanas para chegar à população – e isso se fosse do interesse do então governo divulgá-las. Quando eu era criança, na década de 1980, temas de pesquisa tinham que ser garimpados durante horas nas bibliotecas. Hoje, basta ligarmos o computador. E basta o conhecimento (ou indicação) de alguns bons sites de referência para obtermos uma parte substancial daquilo que precisamos. Mesmo os livros estão mais acessíveis, com os ebooks, cópias de obras que já são de domínio público e compras on-line das obras impressas. Como me disse certa vez uma das pessoas mais sábias que tive a oportunidade de conhecer, hoje em dia já não há mais grandes segredos, pois eles migraram para a internet e as livrarias, ficando ao alcance de todos. A menos que você viva totalmente isolado da civilização, informações sobre os fenômenos naturais de maior impacto é parte integrante do seu cotidiano.
O terceiro e último aspecto diz respeito ao nosso domínio demográfico do planeta. Nossa espécie não só se espalhou por praticamente toda a superfície da Terra como não existe mais isolamento entre as nações – ou seria mais correto dizer que vivemos, ao menos sob o ponto de vista da informação, numa grande nação global? Há menos de um século, boa parte das grandes catástrofes naturais sequer chegava ao conhecimento das pessoas comuns. Em alguns casos porque ocorriam em locais onde não viviam seres humanos, em outros porque estes viviam em comunidades muito pequenas e/ou isoladas. Hoje é praticamente impossível não detectar os eventos naturais que ocorrem pelo mundo. E mais, alguns países extremamente populosos como o Japão e boa parte do Sudeste Asiático se localizam em regiões propícias a maior incidência de tremores, por estarem sobre a junção de placas tectônicas. Logicamente, eventos de maiores proporções nesses locais acabam vitimando muitas pessoas. O número elevado de mortos traz a falsa impressão de que esses eventos estariam aumentando ou ficando piores, sendo que na verdade apenas morreu mais gente, justamente porque lá havia muita gente.
Confesso que essa idéia errônea tão repetidamente proferida por boa parte das pessoas nos últimos anos muito me incomoda. Mas vejo que tem seu lado positivo: mostra com bastante clareza onde e como aqueles que atuam com divulgação científica precisariam trabalhar para que tal quadro se reverta. Sim, é cada vez maior o número de evidencias que ligam as ações humanas às alterações climáticas das últimas décadas. Mas alterações climáticas e movimentos tectônicos possuem origens completamente distintas. Já posso ouvir os brados dos pesquisadores de Wikipedia: “Mas alguns testes com mísseis nucleares causaram tsunamis”. Isso é fato. Como também é fato que a grande maioria dessas ondas gigantescas é causada por tremores naturais. Desastres naturais sempre ocorreram. E com muito mais freqüência que nos dias atuais. A única diferença é que eles nunca mataram e desabrigaram tanta gente. Simplesmente porque há muito mais gente no mundo e praticamente não há mais regiões desabitadas. O planeta encontra-se superlotado.
Em plena era digital, vivemos um novo tipo de antropocentrismo, uma fantasia megalomaníaca disfarçada de inocência (típica da hipocrisia atualmente dominante), um esoterismo pop new age disfarçado de ciência e repleto de “sinais”, aonde o Homo sapiens é visto como o responsável direto por tudo que ocorre no planeta. Até pelo que está muito além do seu alcance. Mesmo com toda a informação e esclarecimento disponíveis, continuamos a acreditar na inexistência de eventos sobre os quais nada podemos fazer e atribuir à nossa espécie poderes quase divinos. De fato é mais fácil culpar o homem do que aprender a respeitar verdadeiramente a natureza, começando por praticar aquilo que se prega. A dinâmica da crosta terrestre independe do que um pretensioso primata bípede e pelado pensa dela. Só resta a ele criar maneiras de evitar o pior nos locais onde a terra inevitavelmente se moverá de maneira nada amigável.

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