sábado, setembro 18, 2010

CIÊNCIA E TRABALHO CIENTÍFICO



Ciência. Este termo (originário do latim scientia = conhecimento; do verbo scire = saber) parece apresentar diversos significados, devido às diferentes finalidades com o qual é utilizado. Muitas vezes apresentado sob um status de superioridade ou sob a forma de verdades incontestáveis, o conhecimento científico sempre esteve presente, com relativa freqüência, nos meios de comunicação. Nas obras de ficção, a ciência muitas vezes tem um importante papel na explicação de fenômenos inerentes à trama, sejam estes reais ou apenas criações do autor da mesma. Nos últimos anos, a mídia tem apresentado de forma bastante acessível, conceitos e descobertas relativas a esse campo do saber.
De acordo com os maiores dicionários, ciência seria: 1. conjunto organizado de conhecimentos relativo à determinada área do saber, caracterizado por metodologia específica; 2. conhecimento que se obtém através de leituras, de estudos; instrução, erudição; 3. conhecimento prático para uma dada finalidade. As duas primeiras definições se aplicam ao que se costuma chamar de trabalho/conhecimento científico (ou acadêmico), enquanto a terceira se refere ao conhecimento ou perícia de modo geral. Contudo, o senso comum muitas vezes apresenta idéias equivocas quanto à definição de ciência, seu funcionamento e suas áreas de atuação. Boa parte de nós vê os cientistas como uma elite detentora de uma suposta “verdade absoluta” ou que a ciência teria “respostas para todos os mistérios”. Alguns, especialmente os mais dogmáticos, vêm na ciência uma inimiga da fé (ou mesmo de Deus). E ainda há aqueles que duvidam da sua eficácia, pelo fato de algumas das suas hipóteses e teorias antigas terem perdido força ou sido modificadas, diante de novas descobertas. De alguma forma, estes últimos pensam que a invalidação de uma hipótese ou teoria científica invalidaria o trabalho dos profissionais da área científica como um todo. Utilizam erroneamente o termo teoria para descrever algo equivalente ao mero “achismo”, uma suposição sem embasamento. Todas essas idéias nascem do desconhecimento. A própria definição dos dicionários é por si só insatisfatória, por não cobrir todas as especificações.
Mas o que é ciência, afinal? Como poderíamos classificar um determinado conhecimento como sendo científico? Para responder estas questões é preciso primeiro definir o procedimento pelo qual a ciência adquire e elabora o seu conjunto de informações. O conhecimento denominado científico baseia-se em certos princípios e numa seqüência ordenada de processos.
Primeiramente, é importante frisar que a ciência é o estudo do mundo material e tudo decorrente deste, como as diversas formas de energia e o comportamento de indivíduos ou sistemas. Logo, a ciência lida apenas com aquilo que é mensurável. Tudo aquilo que não pode ser medido ou quantificado de alguma maneira não faz parte do escopo da ciência. Isso explica porque fé e ciência não são de forma alguma incompatíveis, uma vez que a idéia de divindade ou qualquer conceito equivalente não podem ser abordados pelos mecanismos científicos, justamente por não ser algo mensurável. Entretanto, a ciência é a única maneira viável de lidar com tudo o que é mensurável. É necessário ter isso em mente para compreender a ciência como um todo
Faz parte fundamental da ciência a existência de um método. O tal “método científico” na verdade é constituído por três métodos diferentes: dedutivo, indutivo e hipotético-dedutivo. O chamado método indutivo tem caído em desuso nas últimas décadas. Tal diversidade é perfeitamente compreensível, se lembrarmos que as muitas áreas da ciência não podem fazer uso de metodologia idêntica para analisar coisas tão distintas quando as partículas subatômicas e o comportamento humano. Prometo abordar detalhadamente tais métodos num texto futuro.
Outra característica da ciência é o senso crítico. Qualquer pessoa pode entender o funcionamento do motor de um automóvel. Contudo, um exame científico do mesmo não se resumirá a uma idéia geral do seu funcionamento, e buscará todos os detalhes químico-físicos envolvidos no processo. Durante o seu trabalho, o cientista tentará responder aos diversos “Como?”, “Onde?”, “Quando?” e “Por quê?” que surgirão. Para muitas destas perguntas, não obterá respostas (pelo menos não de imediato), mas tentará chegar o mais perto disso quanto possível. A organização também faz parte do trabalho científico. Embora muitas vezes o cientista analise fatos isoladamente, ele não restringe suas descobertas apenas a estes. Seu trabalho é organizado de modo a unir conceitos e idéias que tratem de assuntos correlatos, bem como separá-los e classificá-los por meio de regras próprias. Com isso, aparece também como uma característica da ciência a generalidade: o fato da ciência trabalhar sempre com um conjunto de idéias que, muitas vezes, remetem a outro conjunto de idéias, mas nunca com idéias totalmente isoladas. Pra estudar um ecossistema, por exemplo, o cientista (no caso um biólogo ou ecólogo) precisará ter um conhecimento ao menos geral da flora, fauna e das condições físicas e climáticas que caracterizam o mesmo.
Como última característica fundamental da ciência encontra-se o prognóstico: com base nas teorias e leis já existentes, um cientista pode tentar prever, de modo organizado e lógico, eventos futuros relativos à sua área de estudo.
Muitas vezes o objeto de estudo de uma determinada ciência não é algo físico ou “palpável”. Por esse motivo, as ciências são divididas primeiramente em naturais (que tratam de fenômenos da natureza; caso da física, da biologia e da geologia) e humanas (que tratam de aspectos referentes à espécie humana, geralmente não-materiais, como a filosofia, a psicologia ou a sociologia). Mas e a matemática? De fato, a matemática se enquadra em todos os conceitos que caracterizam uma ciência; mas o seu objeto de estudo (os números e as diferentes formas de se trabalhar com eles) não pertence ao mundo real, existindo apenas na mente humana. Os números constituem a maneira que o Homo sapiens encontrou para medir o universo. Mas, é importante lembrar, não faz realmente parte deste mesmo universo. De fato é inegável a importância da matemática como ferramenta em outras ciências; como a física, a economia e a estatística. Mas o que um físico, economista ou estatístico faz não é matemática; ele apenas usa as suas propriedades como auxílio ao método correspondente. Lembremos que as representações dos números são apenas isso, representações; não significando de forma alguma que eles realmente existam na natureza. Então seria a matemática realmente uma ciência? A resposta é sim. Ocorre que a matemática, juntamente com a lógica, compõem o grande grupo denominado ciências abstratas (ou ciências “formais”); pelo simples fato dos seus objetos de estudo serem realmente “abstratos”, não existindo no mundo real. As ciências naturais e humanas compõem as chamadas ciências factuais (de factus = fato) ou empíricas (de empiria = experiência). A divisão entre os dois grandes grupos é algo arbitrário, pois sabemos que existem sobreposições (como o próprio uso de procedimentos matemáticos em outras ciências). Um grande número de filósofos da ciência não compartilha desta classificação. Contudo, o caráter abstrato da lógica e da matemática é indiscutível. Costuma-se dizer que as ciências factuais lidam com o “conteúdo” do conhecimento científico, enquanto as ciências abstratas lidam com a “forma” com que o mesmo é estabelecido.
O trabalho das ciências factuais baseia-se numa seqüência que pode ser resumida da seguinte forma: observação, curiosidade, questionamento, formulação de uma hipótese, registro, referências anteriores, teste da hipótese com base em dados coletados ou experimentação, revisão da hipótese e confirmação da hipótese. Este exemplo está propositalmente simplificado para evitar entrarmos em detalhes que poderiam aborrecer o leitor não familiarizado. As ciências abstratas não apresentam alguns destes procedimentos como, por exemplo, a observação direta, uma vez que todo o processo é efetuado na mente do cientista, utilizando para isso o método dedutivo. A observação direta muitas vezes é inviável em algumas ciências; como a astronomia, a física quântica ou a paleontologia. Nesses casos, faz-se uso de meios indiretos, como microscópios, telescópios e comparações. Além da observação espontânea, existe a observação experimental (provocada), utilizada muitas vezes pelo cientista para efeitos de comparação e somatória de dados. Obviamente, muitas vezes o cientista já possui uma série de conhecimentos anteriores que seriam úteis no presente trabalho, e que, por sua vez, determinam os próprios rumos da observação. A este conjunto de conhecimentos pré-estabelecidos dá-se o nome de marco teórico.
É fundamental que uma hipótese científica confirmada possa ser novamente testada por qualquer cientista que quiser verificar sua validade. Se assim não for, então não se está fazendo ciência. Esta é uma das principais diferenças das verdadeiras ciências para as pseudociências – estas últimas, justamente por não descreverem fenômenos reais, jamais permitem a reprodução das suas hipóteses. Uma hipótese confirmada por várias fontes científicas torna-se uma Teoria Científica. Portanto, ao contrário do que dizem alguns leigos, a Teoria é o ápice do pensamento científico e não um mero palpite.
Por outro lado, é também importante não confundir teoria científica com Lei Científica. Enquanto a primeira é uma criação humana para explicar algum fenômeno da natureza, a segunda é um aspecto da natureza (não uma criação humana) que pode ser descrito por um postulado baseado numa teoria (daí o nome Lei). Um exemplo clássico seria a Lei da Gravidade, um fenômeno natural que pode ser expresso por uma explicação originária das teorias de Isaac Newton.
Na história das ciências factuais, teorias novas muitas vezes complementam ou mesmo substituem pressupostos anteriores. Quando se trabalha com o mundo real ou, no caso das ciências humanas, com acontecimentos e idéias que surgiram a partir da interpretação deste, novas descobertas sempre serão feitas. Se os cientistas já soubessem tudo, não teriam porque continuarem trabalhando. Pensando por esse prisma, é um tanto presunçoso imaginar teorias científicas definitivas. Nas ciências abstratas, e apenas nelas, existem teorias e leis definitivas e indiscutíveis: todo mundo sabe e não há meios de contestar que dois mais dois é igual a quatro. Já nas ciências factuais as teorias são provisórias. Obviamente, pode ocorrer de algumas se tornarem permanentes, mas os cientistas não contam (e nem deveriam contar) com isso. E velhas teorias ainda possuem sua serventia. Sim, pois muitas delas constituíram o passo inicial de primorosas descobertas posteriores. O modelo atômico moderno jamais teria surgido se antes Bohr e Rutherford não tivessem estabelecido os seus modelos em suas respectivas épocas. Excluir completamente teorias passadas como se fossem lixo é, no mínimo, ingênuo.
Certamente, a ciência não tem respostas para tudo. Na verdade, esse nem mesmo é o seu objetivo. Os profissionais da ciência tentam compreender o mundo que os cerca e fazem uso das ferramentas que dispõem para isso. Caso a resposta não surja, tentam chegar sempre o mais perto dela possível. E se mesmo assim ela demorar a aparecer, isso não constitui problema algum. Como disse certa vez Albert Einstein; o mais importante não é obter todas as respostas, mas sim compreender todas as perguntas.

5 comentários:

* Andhora Silveira * disse...

A Ciência pode não ter respostas para tudo, mas torna o mundo mais excitante: O mistério e questionamentos gerados pelo inquietamento humano na busca de compreender o mundo que o rodeia e a si mesmo é o âmago da Ciência. O método científico é essencial nesse sentido: você tem um objeto de estudo... você tem um fenômeno relativo a esse objeto de estudo... experimentos... hipóteses... conclusões... teorias... provas... refutações... esse é o combustível da ciência.

Adorei o post. Muito bom =)

Átila Oliveira disse...

Obrigado.
Opiniões são sempre bem vindas.

.:OSMIR:. disse...

ae, meu camarada saurio!. curti o novo blog. o design esta bacana, clean e acredito que, como voce prometeu, volta o foco ao assunto que inicialmente eram de interesse do outro blog. parabens!!

Átila Oliveira disse...

É isso aí mano. Que bom que gostou.

Bondgirlpatthy 007 disse...

Engraçado, tem gente q confunde as coisas. Na verdade, ela busca respostas realmente eficazes mas não são a solução de todos os problemas. Aliada à fé pode trazer benefícios permanentes mas o homem precisa fazer tb a sua parte e não esperar q tudo caia do céu. Bjs

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