terça-feira, setembro 28, 2010

SOBRE O DIREITO DE ANULAR O VOTO



O voto em branco e o voto nulo são, na maioria das vezes, uma atitude emocional de quem, desencantado com a política e com os políticos, opta por abdicar de uma responsabilidade de cidadania para com o próprio país.”

A afirmação acima é do megaempresário Emílio Odebrecht, publicada no último domingo pelo jornal Folha de São Paulo, onde o mesmo possui uma coluna semanal. O parágrafo citado me chamou especial atenção pela maneira como o colunista se refere àqueles que não possuem candidatos para as próximas eleições (sempre bom lembrar, obrigatória), que se realizarão no próximo domingo, dia 03 de outubro. O título do texto chega a ser irônico: “Pelo voto consciente”.
Vivemos em um regime político, até certo ponto, democrático – não acredito que sejamos uma verdadeira democracia, mas não cabe discutir isso aqui hoje. Um regime que se pretende democrático inclui o direito de não apreciar a proposta de nenhum candidato vigente e ter uma opinião bem formada sobre isso. Ou seja, inclui o direito de não querer votar em ninguém. Muitos cidadãos bem informados questionam não apenas o ato de votar, como também a obrigatoriedade do voto, defendendo a mudança do pleito para facultativo. Eu particularmente discordo desta postura. Seria de fato ótimo se o voto por aqui não fosse obrigatório, como acontece em alguns outros países. Ocorre que vivemos no Brasil, um país cuja falta de conhecimento e, principalmente, consciência política da maioria da população são notórias; visto a vigente política de pão e circo que vem dando muito certo para aqueles que a praticam. A maior parte dos filiados a partidos políticos no nosso país é formada por fanáticos paternalistas e totalitaristas, cegos e, não raras vezes agressivos, a qualquer tipo de observação crítica. Boa parte dos brasileiros considera perfeitamente natural trocar o seu voto por favores pessoais. Basta o mínimo de capacidade de observação para notar que um bom contingente de cidadãos com tal postura torna-se um rebanho facilmente pastoriável, especialmente se paternalismo e assistencialismo vierem travestidos de consciência política – que na verdade, ao invés de esclarecer, oculta e distorce fatos. Soma-se a isso o circo de aberrações cada vez mais bizarro que se tornou a propaganda política, hoje com tipos que vão de Tiririca a Mulher Pêra. Como disse recentemente uma amiga no Twitter, que saudades do Clodovil!
A impressão que o senhor Emílio Odebrecht me passou, além de preconceituosa, parece típica daqueles intelectuais que conhecem a “realidade” brasileira exclusivamente através do conforto da sua grande e confortável poltrona, sem nunca ter tido contato direto com a mesma. Caso contrário saberia que cidadania é muito mais do que digitar números numa urna eletrônica que muitas vezes corresponde a um indivíduo cujas propostas e histórico político o eleitor desconhece. A coisa é muito mais complexa do que mostra o politiquês jornalístico. Seria realmente uma maravilha se houvesse várias propostas interessantes e confiáveis para escolher, mas sabemos que as coisas não funcionam desta maneira. Aqueles que vivem no mundo real sabem muito bem que as eleições, bem como as candidaturas nelas presentes, estão bem distantes do espetáculo cívico bonito e organizado que esse distinto senhor faz parecer. Na verdade, é uma das melhores representações do termo popular “lei do cão”. O que seria pior: não votar ou vender o voto? Quem vota nulo ou em branco não está sendo “emocional” (mesmo porque os fatos mostram que aqueles que defendem candidatos costumam ser muito mais emocionais), muito menos irresponsável. A maioria dos que o fazem não é apenas por estar “desencantado com a política e com os políticos”. É justamente o oposto: quem vota em branco ou nulo é, geralmente, quem possui maior consciência política e maior esclarecimento sobre o que ocorre no país. Antes de qualquer coisa, está expressando a sua opinião. Felizmente, além do voto direto para diversos cargos públicos, a Constituição nos garante o direito de votar em branco ou anular o voto. Se nenhuma proposta é do agrado de determinado eleitor, por que ele teria que votar em alguém? Só falta agora criarem uma obrigatoriedade de opção pelo candidato A ou pelo candidato B, como se a obrigatoriedade do voto em si já não fosse suficiente. Cidadania é, em sua essência, conhecer seus direitos e seus deveres como cidadão. Num pensamento popular que privilegia os primeiros em detrimento dos segundos e acompanhado de governos que há décadas não produzem nenhum esforço que ajude a mudar essa mentalidade, fica difícil enxergar a verdadeira civilidade. É de um otimismo exagerado, pra não dizer infantil, crer que a simples escolha por um candidato ou partido solucionaria isso. Como se vê: votar em branco ou votar nulo é, muitas vezes, a atitude mais consciente.
Talvez os adeptos de tal opinião prefiram o “voto de protesto” ao voto branco ou nulo – sem sombra de dúvida, uma das maiores imbecilidades já criadas. Para os mais desavisados esclareço: entende-se por voto de protesto, votar em algum candidato extremamente caricato e/ou aparentemente sem qualquer chance de ser eleito, como uma forma de demonstrar toda a sua indignação. Essa atitude tornou deputado Frank Aguiar em 2006, deixou Enéas Carneiro em terceiro lugar na eleição para presidente em 1990 e provavelmente elegerá Tiririca (até o momento desconheço o desfecho da sua avaliação como candidato apto, ou seja, alfabetizado) que lembremos, não é uma pessoa, mas um PERSONAGEM. Sendo bem pragmático, pelo menos votar em branco ou anular o voto não oferece qualquer perigo à população. Apenas ao interesse de alguns candidatos. Talvez aí resida o problema para alguns
Antes que os militantes das suas religiões representadas por siglas e cores comecem a destilar seu ódio, aviso que não sou filiado e nem apoio nenhum partido político. Muito pelo contrário: há anos sou adepto do voto nulo para a maior parte dos cargos que posso escolher. Esse é um direito meu. E um direito que gostaria que se mantivesse até o dia em que o brasileiro finalmente se torne um cidadão realmente político, a ponto de não mais ser obrigado a votar. Portanto, aqueles que me acusarem de qualquer postura política estarão apenas demonstrando sua completa e abissal ignorância, sob o risco de arrancarem gargalhadas de qualquer pessoa medianamente esclarecida. Pelas razões explicadas anteriormente, não vejo problemas em sair da minha residência cedo, em pleno domingo, para expressar minha opinião na urna. Mesmo porque no caminho tem uma feira cujo delicioso pastel eu recomendo.

8 comentários:

Isabella Bertelli disse...

Pois é, gostaria de saber quem inventou essa história de que cidadania é votar! Isso é uma limitação absurda do conceito (que faz parecer que cidadania é, única e exclusivamente, votar), que faz todo o sentido em um país em que as pessoas só colocam bandeiras e se unem na época da copa de futebol. Também cabe perfeitamente ao "cidadão" que culpa o Lula pelo trânsito de São Paulo, mas que não abre mão de sair em seu carro; que culpa o Lula pelas enchentes, mas joga lixo no chão. Não que os políticos não tenham nenhum papel nesses infortúnios, mas parece que falta uma consciência de que somos seres ativos em um ambiente, que é feito de muitas atitudes individuais. Aí fica fácil votar no candidato que garanta o MEU emprego ou ME dê uma cesta básica.
A esquina em que cidadania e bem coletivo se encontram há tempos não é visitada pelos brasileiros.

Bondgirlpatthy 007 disse...

Querido "dino", O problema é q por cultura não protestamos, não cobramos as "promessas" e não fazemos mais nada a não ser nos queixarmos. Precisávamos parar c/ essa história de q discutir política é chato. Discutir em minha opinião é fazer nossa parte, nos manifestarmos sempre que estivermos indignados c/ algo mas fazer esse tipo de manifestação sem violência. Fazermos nossa parte com pequenas atitudes como conservar as ruas limpas por exemplo. Bjs

Bondgirlpatthy 007 disse...

Querido "Dino", o problema é q depois de votar não fazemos nada. Não temos a cultura de cobrar os legisladores por suas promessas. Discutir política é sempre chato, não temos o hábito de conversar sobre isso e tb de nos informarmos. E tb não fazemos nada p/ colaborar. Só reclamamos e não fazemos nada p/ colaborar como por exemplo manter as ruas limpas. Todos somos culpados pelo q acontece pois somos nós quem escolhemos os governantes. Bjs

Anônimo disse...

Big Sauro!!!!
Parece que os chamados responsáveis não vivem no Brasil. Falam tanta tolice no horário eleitoral. E se vivemos em democracia, por que tenho que votar?
Abraços mano Sauro

Átila Oliveira disse...

Seja bem vinda, Isabella.
Muito bem lembrado, a maior parte dos brasileiros só olha pro próprio umbigo e ainda se exime das suas responsabilidades, achando que quem deve cuidar da dua vida é o governo. Assim fica difícil.

Átila Oliveira disse...

Verdade Patthy. Falta cobrança de boa parte da população também. A maioria acha que tudo começa e termina no voto. Acompanhar o candidato depois de eleito também faz parte do cidadão. Beijos.

Unknown disse...

Votei nulo pra presidente e estou feliz por pelo menos ter essa opção para deixar claro que não fiquei satisfeita com os candidatos.
Valeu, Átila. Ótimo blog, já está linkado.

Beijos
Cris

Átila Oliveira disse...

Obrigado pela ilustre visita e elogios, Christie. Pois é, votar nulo é exatamente isso. Pena que muitos não entendem. Beijos

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